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Indígena participa de intercâmbio no Suriname

Pesquisadora participou de projeto que estudou as especificidades socioculturais e linguísticas de povos indígenas e quilombolas

Atualizado há

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Eliane Boroponepa Monzilar, da Aldeia Boropo, no Território Indígena Umutina, no Mato Grosso, foi a primeira indígena a fazer o doutorado-sanduíche do projeto Diálogos de Saberes Interculturais Brasil – Suriname, vinculado ao Programa de Desenvolvimento Acadêmico Abdias Nascimento. Nesta parceria do MEC com a CAPES, a pesquisadora deu continuidade ao trabalho  “Aprender o conhecimento a partir da convivência: uma etnografia indígena da educação e da escola Umutina”.

Fale sobre sua trajetória acadêmica

Graduei-me em Ciências Sociais na Universidade do Mato Grosso (Unemat) na primeira turma de formação de professores indígenas de ensino superior, que aconteceu entre 2001 e 2005. Essa graduação começou como terceiro grau indígena, com a formação de cerca de 200 professores de todo o País, sendo 180 do  Mato Grosso, e hoje é uma faculdade intercultural. Foi uma experiência acadêmica muito importante, onde tivemos uma grande diversidade cultural e linguística dentro do espaço, mas também muita resistência devido ao conflito cultural. Os participantes eram de vários povos, com contextos diferentes, colonização diferente, alguns eram fluentes na língua portuguesa e outros não, mas com muito diálogo foi possível entender o universo de cada povo e estabelecer uma comunicação. Essa graduação foi, na verdade, uma demanda das lideranças e do movimento indígena do Mato Grosso, pois nas aldeias eram os não indígenas que atuavam como professores.

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Depois de três anos, surgiu a oportunidade de participar do mestrado profissionalizante no Departamento de Desenvolvimento Sustentável de Turismo na Universidade de Brasília (UnB), com uma turma de indígenas e indigenistas. Nesse mestrado, com meu olhar mais amplo e holístico, fiz um intercâmbio cultural de 20 dias com indígenas da Amazônia, onde estive com o povo Tukano, Yanomami e outros do Rio Negro. Por fim, em 2015, entrei no doutorado desmembrando a pesquisa do mestrado, onde fui bolsista pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e participei do projeto Diálogos de Saberes Interculturais Brasil-Suriname financiado pela CAPES, quando passei 12 meses naquele país.

Qual foi seu objeto de estudo?
A pesquisa do mestrado foi sobre Território e Sustentabilidade, na qual estudei a relação da sustentabilidade dentro do território, pois na minha comunidade as pessoas estavam sendo fragilizadas, deixando de fazer as práticas do manejo do solo. Muitos indígenas mais novos não conheciam o próprio território, então fiz um trabalho de campo com as pessoas para conhecer o espaço, a divisa com as fazendas, fizemos oficina com jovens e lideranças para conscientizar sobre como sobreviver com os recursos naturais existentes. Antes disso, a realidade era que parte da população saia da aldeia em busca de serviço e esse trabalho fez com que começassem a retornar e exercitar o manejo do cultivo da roça dentro de cada família.

Em 2019, a minha dissertação foi transformada em um livro, que lancei com recursos próprios, e também num documentário de 30 minutos onde mostro todo o trabalho das pessoas do povo Balatiponé-Umutina e de como se relacionam com a natureza, as atividades desenvolvidas na roça, o cultivo de vários de tipos de plantação.

Como a CAPES contribuiu para sua formação acadêmica?
Entrei no doutorado em 2015 sendo bolsista do CNPq e participei do projeto Diálogos de Saberes Interculturais Brasil-Suriname financiado pela CAPES, para mobilidade acadêmica internacional entre a UnB e a Anton de Kom Universidade, do Suriname (ADEKUvS, Suriname). Nele, fiz um doutorado-sanduíche, uma experiência magnifica que tive com os indígenas e Maroons do Suriname, onde fiquei por 12 meses.

O doutorado-sanduíche, com financiamento da CAPES, contribuiu para perceber as conquistas, os avanços e os gargalos que existem entre indígenas do Suriname e do Brasil. São lutas em comum pela terra, pela educação, mas que a situação traz contextos diferentes, alguns avançaram mais. No Suriname, eles têm organização muito consolidada, diferente do Brasil que tem um movimento que está sendo consolidado, mas precisamos conquistar ainda mais. A experiência de estar em outro país foi rica e desafiante, não dominava o inglês nem o holandês, ainda não tenho relação amigável com inglês, mas consegui ter essa experiência em lugar distinto com indígenas e não indígenas.

Nessa experiência, o que foi mais marcante?
Acredito que foi o protagonismo de uma mulher indígena do povo Balatiponé ter saído da sua aldeia e estar transitando no mundo acadêmico. Existe uma radicalidade, um sistema bem brutal e é importante no sentido da visibilidade, de trazer para a pauta a discussão dos saberes indígenas. Para mim, mostrar que existe uma quebra de paradigmas, que existe outras formas de fazer conhecimento nessa interculturalidade foi ponto fundamental. Não é dizer que um conhecimento é maior do que o outro, mas que o conhecimento dos povos indígenas também é uma ciência e precisa estar dialogando com o conhecimento cientifico eurocêntrico. Outro aspecto, é a questão do respeito a partir da valorização do papel da mulher, porque quando concluí o doutorado fui convidada a dar palestras em vários lugares.

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