Estudante acusa polícia de tê-la pressionado a desistir de acusações e culpa sistema judicial por baixo índice de casos de estupro levados à Justiça.
Maria (nome fictício) tinha 20 anos quando foi estuprada no alojamento da tradicional e prestigiosa universidade de Oxford depois de ficar embriagada durante um jogo de pôquer.
Mas foi só no dia seguinte, quando conversou com um amigo, que teve uma ideia do que tinha acontecido.
“Fiquei muito bêbada. Desmaiei e alguém me estuprou”, contou a jovem.
“No dia seguinte, acordei por volta de duas da tarde. Um amigo me mandou uma mensagem perguntando o que tinha acontecido na noite anterior. Eu estava me sentindo um tanto estranha em relação ao episódio, mas foi só quando ele disse ‘Maria… isto é estupro’, que percebi que aquilo não era aceitável.”
A estudante conta que denunciou o caso à polícia, mas “eles não ajudaram muito”.
“A polícia veio à minha casa e pediu para guardar meus lençois, roupas e preservativos para as provas”, disse.
“Mais tarde veio uma mulher que basicamente disse que meu caso não se sustentaria na Justiça, e ordenou que (os outros policiais) me entregassem de volta os sacos com as provas.”
‘Injusto’
Maria decidiu não avançar com o caso mas considera que “não acha justo” ter sido pressionada pela polícia a tomar apressadamente uma decisão de levar o caso à Justiça ou não.
Ela afirma que o caso já ocorreu há muito tempo e ela não tem mais as provas, por isso não acredita que levará o caso à Justiça.
Em comunicado, a polícia de Thames Valley, responsável pela área de Oxford, declarou que “leva muito a sério todas as denúncias de estupro e crimes sexuais” e que alguns dos comentários de Maria são “extremamente preocupantes”.
“Mas como ela escreveu de forma anônima, precisamos que entre em contato diretamente conosco, para que possamos identificar o caso e investigar de forma apropriada as alegações feitas.”
A Universidade de Oxford é formada por 38 faculdades e Maria lembra quando conversou com os funcionários da universidade responsáveis pelo bem-estar dos estudantes.
De acordo com ela, eles conversaram algumas vezes com o suposto estuprador. “Algumas semanas depois eles decidiram que estava tudo bem e que podiam desistir (do caso)”, disse.
A aluna disse que a situação se tornou extremamente constrangedora, pois o estuprador “sempre por perto” nas festas da universidade.
Impunidade
Maria contou seu caso em um blog (que pode ser lido aqui, em inglês): “Foi estuprada na Universidade de Oxford; a polícia me pressionou a desistir da acusação”, relatou a blogueira.
No texto, ela usa o seu caso para explicar por que apenas 15% dos estupros denunciados à polícia na Grã-Bretanha chegam à Justiça.
“O sistema de justiça criminal, não o fato de as mulheres beberem, é o culpado pelo (baixo) número de condenações”, diz.
Após a publicação, a Universidade de Oxford revisou sua política contra o assédio sexual e desenvolveu novas diretrizes para orientar os funcionários a lidar com crimes sexuais ou violência, incluindo estupro.
“A violência sexual, como todas as formas de assédio sexual, é inaceitável na Universidade de Oxford”, declarou a instituição em nota.
“Oferecemos apoio em diversos níveis para todas as vítimas, incluindo as de violência sexual, estupro ou ataque, e agora a coordenação é centralizada.”
Também foram organizadas oficinas para discutir a questão do consentimento sexual com os calouros.
A questão é discutida em outras universidades da Grã-Bretanha. Na semana passada a polícia na região de Manchester lançou uma nova campanha junto com movimentos estudantis e universidades do noroeste da Inglaterra.
Os folhetos afirmam que “Beber não é crime. Estupro é”. O material foi distribuído em bares, casas noturnas e alojamentos estudantis.
A polícia também está promovendo uma mobilização nas redes sociais usando a hashtag #noconsentnosex (‘sem consentimento, sem sexo’, em tradução livre).
Atitudes
Na semana passada, a união nacional de estudantes britânica encerrou uma campanha chamada “Recupere o seu Campus”, que encampou atividades contra a violência de gênero durante 16 dias.
Uma das promessas da campanha era a de exigir que as universidades “investiguem o nível de assédio e crime nos campi e disponibilizem os resultados para o público”.
Mas Maria acredita que existe um problema de atitude em relação ao estupro de mulheres sob o efeito do álcool ou substâncias.
“Não tenho culpa de ter desmaiado, mas ele tem culpa de ter me estuprado”, disse.
Apesar de não levar o caso adiante, Maria acha que seu estuprador sabe do blog que ela escreveu.
“Ele deve saber que estou apenas a um click de revelar para todo mundo que ele é estuprador, e isto me dá muito poder”, diz.
“Para mim, isso é quase suficiente. Não preciso que ele vá para a prisão, mas quero acreditar que, com as palestras sobre consentimento sexual na universidade, ele não vá reincidir no crime.”
A jovem tampouco quer ser definida pelo que ocorreu naquela noite. “Quero achar que há mais coisas na minha personalidade além de ter sido estuprada”, afirma.
“Não quero que as pessoas olhem para mim e pensem, ‘essa é a garota que foi estuprada’. Quero que pensem, ‘essa é a menina que fez X, Y e Z – ela é incrível'”.
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Fonte: G1