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Ouro ilegal da Amazônia ganha rotas para Guiana, Venezuela e Suriname

Nessas nações, as regras menos rígidas para a negociação de metais preciosos favorecem o tráfego do ouro

Atualizado há

DA REDAÇÃO – Após a imposição de restrições pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Receita Federal sobre a comercialização de ouro no Brasil, quadrilhas especializadas no garimpo ilegal do minério passaram a exportar sua produção para países vizinhos, como Venezuela, Guiana e Suriname, de acordo com investigações da Polícia Federal. Nessas nações, as regras menos rígidas para a negociação de metais preciosos favorecem o tráfego do ouro, que posteriormente é destinado a mercados internacionais nos Estados Unidos, Europa e Oriente Médio.

Uma operação deflagrada no dia 11 de dezembro de 2024 revelou detalhes sobre o funcionamento do tráfico internacional de ouro ilegal. O foco principal da ação foi uma organização criminosa suspeita de movimentar cerca de R$ 4,3 bilhões entre fevereiro de 2023 e março de 2024. A investigação apontou que imigrantes venezuelanos eram utilizados para transportar o ouro dos campos de mineração no Brasil para os países vizinhos, como parte de uma cadeia de contrabando mais ampla. Além disso, trocas de mensagens entre os membros do grupo indicaram que empresários do Líbano e da Arábia Saudita eram convidados a visitar áreas de mineração na Amazônia, com o objetivo de investir no negócio irregular.

Rota do ouro ilegal: Boa Vista e Itaituba

De acordo com a Polícia Federal, havia dois centros operacionais principais dessa rede criminosa: um em Boa Vista (RR) e outro em Itaituba (PA), conhecida como a “capital do ouro” no Brasil, tanto na vertente legal quanto ilegal da atividade. Após a extração do ouro, o minério era transportado para Manaus ou Belém, de onde seguia por via aérea para a Guiana e Venezuela.

A operação Flygold 2 teve início com a prisão do venezuelano Anthony Morillo Mendez, em outubro de 2023, em Santarém (PA). Mendez, flagrado com 21 quilos de ouro escondidos em garrafas térmicas, estava prestes a embarcar para Manaus. Durante as buscas em seu endereço, a PF encontrou mais evidências de seu envolvimento, como malas com compartimentos falsos e materiais para esconder o ouro. Além de Mendez, outros cinco venezuelanos foram identificados como membros da quadrilha, e a PF estima que eles tenham transportado mais de 400 quilos de ouro em apenas um mês, totalizando aproximadamente R$ 130 milhões.

Dois meses após a prisão de Mendez, em dezembro de 2023, outra apreensão de ouro ocorreu, desta vez em Manaus, durante uma tentativa de assalto a um transportador da quadrilha. Os criminosos foram presos com 47 quilos de ouro, avaliados em R$ 14 milhões, pouco antes de o carregamento ser embarcado em um jatinho com destino ao exterior.

Impacto das medidas restritivas

Esses dois flagrantes ocorreram após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de extinguir a chamada “presunção de boa-fé” no comércio de ouro. Anteriormente, esse mecanismo permitia que os compradores de ouro extraído de garimpos apresentassem apenas a palavra do garimpeiro como prova de legalidade, sem a necessidade de comprovação documental mais rigorosa. Com a nova regra, os comerciantes de ouro passaram a ser responsabilizados caso adquirissem material de origem ilegal.

Além disso, em maio de 2024, a Receita Federal passou a exigir a nota fiscal eletrônica para a transação do minério, facilitando o rastreamento da origem do ouro e a fiscalização. As medidas impactaram significativamente a produção de ouro nos garimpos brasileiros. Dados do Instituto Escolhas indicam uma queda de 84% na produção entre janeiro e julho de 2024, em comparação ao mesmo período de 2022. No Pará, o declínio foi ainda mais acentuado, alcançando 98%.

A procuradora Thais Medeiros, do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, destacou que a redução da produção foi visível nas áreas de comercialização, mas observou que as imagens de satélite ainda não indicam uma diminuição substancial nas áreas de garimpo. Isso sugere que, embora o mercado legal tenha encolhido, a exploração ilegal do ouro persiste, agora mais escondida, com o escoamento migrando para a rota clandestina.

Lavagem de ouro

Em 2021, o MPF do Pará ajuizou ação judicial para suspender as operações de três das maiores Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVMs), que possuíam várias filiais em Itaituba. A investigação apontou que essas instituições foram usadas para lavar ouro extraído ilegalmente, com estimativas indicando que 49 toneladas de ouro foram lavadas entre 2019 e 2020, conforme estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Especialistas consideram que as novas regras instituídas pelo STF e pela Receita Federal tiveram um impacto positivo na redução do mercado legal de ouro, mas alertam para a necessidade de intensificação da fiscalização nas fronteiras para conter o tráfico de ouro ilegal. O caminho do ouro, agora mais subterrâneo e complexo, exige uma ação coordenada entre as autoridades para evitar que o fluxo continue a ser desviado para mercados internacionais.

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