Prestes a ultrapassar o Brasil como a sétima economia do planeta, a Índia patina ao tentar controlar o avanço desse tipo de crime. Lá, uma mulher é violentada a cada 25 minutos. E com frequência se atribui a culpa à própria vítima.
Com mais de 800 milhões de eleitores, de um total de 1,2 bilhão de habitantes – o que a coloca no posto de maior democracia do mundo -, a Índia coleciona contradições. O mesmo país que, neste ano, deve superar a China em crescimento – 7,2% – tem quase um Brasil inteiro, 200 milhões de pessoas, vivendo em situação de extrema pobreza. Embora exporte para potências estrangeiras alguns dos melhores engenheiros e tecnólogos da atualidade, tem cerca de 80% da população que mal conseguem assinar o nome. O trânsito nas grandes cidades é espantosamente caótico, porém menos de 2% das pessoas possuem carro. Na última lista de bilionários da revista americana Forbes havia 90 indianos, 28 deles estreantes no levantamento, contudo, o atual premiê, Narendra Modi, se elegeu tendo como uma de suas principais bandeiras a construção de banheiros públicos – as ruas são frequentemente usadas como privadas pelos cidadãos. Seria mais do que suficiente parar por aqui, mas eis que se impõe a contradição das contradições. Frequentemente associada à ideia de uma “terra plena de espiritualidade”, para a qual se deslocam milhares de estrangeiros todos os anos, em busca de “iluminação interior”, a Índia ostenta uma insuportável característica: os casos de estupro se multiplicam de modo estarrecedor.
Segundo o Escritório Nacional de Registros Criminais do país, os casos de estupro aumentaram 26,7% entre 2012 e 2013. Pelas estatísticas atuais, uma mulher é violentada a cada 25 minutos. Só em Nova Délhi, em dez anos, houve uma variação da ordem de 329%, o que rendeu à cidade a alcunha de capital mundial do estupro.
Há poucas semanas o governo tentou encerrar uma discussão que vem ganhando fôlego desde que o país endureceu as leis de violência sexual, em 2013: o fato de o estupro marital, ou seja, aquele cometido pelo marido, não ser passível de crime. Em um comunicado endereçado às Nações Unidas, o ministro do interior, Haribhai Chaudhary, tentou sustentar a posição oficial. “O conceito de estupro marital, como é conhecido internacionalmente, não pode ser aplicado ao contexto indiano por vários fatores: analfabetismo, pobreza, valores, costumes, crenças religiosas, o fato de a sociedade tratar o casamento como um sacramento etc”, observou ele. O anúncio surtiu o efeito contrário e as críticas vieram de forma avassaladora, afinal, o que choca no país não são só os números, mas principalmente a maneira como a sociedade, incluindo a elite política, encara o problema: mais como uma contingência do que como um crime a ser combatido a todo custo.
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Fonte: Veja