Além da excelência, custo e relação candidato/vaga menores que no Brasil atrai aspirantes a médico; é possível atuar no país após validação do diploma
“U menya golovnaya bol” (У меня головная боль), do russo, significa “estou com dor de cabeça”. Essa é uma das muitas expressões que a estudante de medicina Taís Chriguer, 24, vai ouvir ao longo do curso de medicina da Universidade Médica Estatal de Kursk, na Rússia, a cerca de 500 km de Moscou.
Natural de Sorocaba, no interior de São Paulo, ela está no segundo ano. “Após quatro tentativas, desisti de tentar medicina no Brasil. Os vestibulares oferecem poucas vagas para faculdades públicas e as particulares têm mensalidade muito alta”, afirma ela que, apensar de estudar na Rússia pretende atuar no Brasil.
Taís está entre os 500 brasileiros que estudam medicina na Rússia atualmente. O dado é da Aliança Russa, empresa responsável por administrar a graduação e pós-graduação de brasileiros no país.
Segundo a empresa, o Brasil é a segunda maior nacionalidade a procurar medicina na Rússia, ficando atrás apenas da Malásia.
“Nos últimos anos, houve um aumento de 20% na procura por vagas em universidades russas, especialmente de medicina. O preço bem abaixo comparado com as universidades brasileiras, a qualidade do ensino e a possibilidade de atuar em países da Europa são as principais razões desse aumento”, afirma Carolina Tellez, diretora da Aliança Russa no Brasil.
Os médicos formados na Rússia podem atuar no Brasil desde que passem pelo Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida), aplicado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), com adesão de universidades públicas para a validação do diploma.
O Revalida conta com duas etapas: a primeira é uma prova com questões objetivas e dissertativas, com caráter eliminatório, e a segunda, uma prova de habilidades clínicas.
Após a aprovação no Revalida, o médico deverá solicitar autorização para trabalhar ao Conselho Regional de Medicina do Estado do local onde pretender atuar. O prazo para todo esse trâmite é variável.
Mesmo com a dificuldade da língua – além do russo, as aulas também podem ser acompanhadas em inglês -, o curso na Rússia tem atraído futuros médicos brasileiros, como Taís ressalta, pela maior oferta de vagas e pelo valor da mensalidade em relação aos cursos no Brasil.
Enquanto no Brasil a média da mensalidade de uma faculdade de medicina particular é R$ 6 mil, de acordo com o Sindicato das Mantenedoras de Ensino Superior (Semesp), na Rússia, o custo semestral é de cerca de R$ 10 mil reais (em torno de US$ 3.000), o que representa uma média de R$ 1.600 por mês.
Segundo a Aliança Russa, esse valor é fixo e inclui seguro médico e moradia universitária, na própria faculdade.
Já a relação candidato/vaga também é diferente: na Faculdade de Medicina da Universidade Médica Estatal de Kursk, por exemplo, são cinco candiados/vaga contra 135 candidatos/vaga na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Segundo a Aliança Russa, as universidades são equivalentes.
Uma peculiaridade das universidades russas é que as aulas são 100% presenciais e não é permitida nehuma falta.
A paulistana Bruna Barbosa, 23, teve os mesmos motivos de Taís para estudar na Rússia. Há seis anos tentando ingressar em uma faculdade de medicina no Brasil, ela diz que convenceu os pais, no início deste ano, a deixá-la a se mudar para Kursk, na Rússia. Ela também cursa a Universidade Médica Estatal de Kursk.
Cursando o primeiro semestre, ela afirma que a maior dificuldade tem sido o idioma. Embora em Kursk seja possível ter as aulas em inglês, no dia-a-dia, o russo se faz necessário, segundo ela.
O curso do idioma russo é oferecido ao longo do curso para que os estudantes possam ter contato com os pacientes, sendo ensinados desde o alfabeto (na Rússia é usado o alfabeto cirílico russo, enquanto no Brasil é usado o alfabeto latino) até o idioma avançado.
“Cursar medicina na Rússia abre portas para a possibilidade de emprego na Europa, por conta do Tratado de Bolonha, que unifica todo o sistema educacional superior na União Europeia e Rússia”, diz a diretora da Aliança Russa no Brasil.
O país tem tradição em medicina. É terra natal de dois prêmios Nobel na área: Ivan Pavlov, em 1904, pelos estudos de fisiologia e digestão, e Ilya Mechnikov, em 1908, pelos estudos em imunologia. E também de Dmitri Mendeleev, criador da tabela periódica.O país é berço da psiquiatria, traumatologia, oftalmologia e neurologia, tendo excelência nessas áreas.
Apesar da fama de “frios” dos russos, os estudantes de medicina aprendem a realizar um atendimento humanizado, segundo Carolina. “Há uma matéria que orienta os alunos a tratar os pacientes de maneira mais humanizada e conversar com a pessoa”, diz.
O paulistano Bruno Nimtz, 21, está há um ano na Rússia e pretende entrar na First Pavlov State Medical University of St. Petersburg (Primeira Universidade Médica do Estado de São Petersburgo academia I.P. Pavlov) e se especializar em psiquiatria.
Nimtz explica que, antes de entrar para a faculdade, é necessário passar por uma espécie de faculdade preparatória, dentro da própria universidade.
Nesse lugar, os alunos estudam os idiomas inglês e russo, além de química e biologia, de forma a se prepararem para o primeiro ano de medicina.
Carolina explica que, após o término da faculdade, a maioria dos estudantes brasileiros volta para o país de origem e apenas 30% vai para a Europa ou fica na Rússia. “A Rússia é um país com muitos médicos e o mercado de trabalho no país está saturado, dificultando a oferta de empregos para estrangeiros”, diz.
Fonte: R7